
Adolescência: Fenômeno Natural ou Social?
A adolescência é um fenômeno que, tal qual conhecida hoje, é um constructo social de suma importância na formação da identidade dos indivíduos.
Como explicam Mead (1961) e Griffa e Moreno (2008), em algumas sociedades tribais a passagem do mundo infantil para o mundo adulto é breve e segue padrões definidos em rituais. Normalmente, em poucas semanas o jovem é instruído nas artes de obtenção de alimento e de proteção, casa-se e assume a condição de adulto.
No mundo contemporâneo, a necessidade de capacitação e educação para que a pessoa possa se inserir no mundo do trabalho influenciou e marcou diretamente a formulação do conceito de adolescência, que até poucas décadas atrás “não passava de uma sala de espera do mundo adulto.” (Griffa & Moreno, 2008. p. 9)
Nas sociedades modernas industrializadas criou-se um intervalo de aprendizagem entre a maturidade biológica e a maturidade social, que em geral, são demarcadas pelas etapas escolares, devido à carência de rituais de passagem. Neste sentido, os acontecimentos psicológicos da adolescência não são necessariamente, em nossa sociedade, “um correlato das mudanças físicas da puberdade, mas também uma construção cultural, produto da complexidade das mudanças sociais” (Pereira, 2005, p. 02)
Ressalta-se neste ponto, que em diferentes culturas e grupos, como no oriente, em sociedades predominantemente rurais ou de nível sócio econômico mais baixo, há uma variação na duração e na definição do período da adolescência, que repercutem no papel e na vivência desta.
Atualmente, na cultura ocidental, a adolescência se caracteriza e define como a fase de transição entre a infância e a vida adulta. Advindo do latim adollacentia (ad= a, para; e, olescer =crescer), significa “crescer” ou, “crescer em direção à maturidade”, condizendo com o processo vivido nessa etapa da vida, referindo-se, ao processo de crescimento do indivíduo. Francoise Dolto (1990) descreve esse período como um purgatório, similar ao sofrimento do parto, de um segundo nascimento psicológico.
Em uma definição cronológica, compreende-se a adolescência na faixa etária de 12 a 19 anos completos. Entretanto, considera-se que há divergências nesta cronologia dependendo da fonte consultada. (Santos & Tosta, 2016)
Nesta perspectiva, entende-se que o desenvolvimento humano é caracterizado por mudanças cumulativas e irreversíveis. O indivíduo, como um sistema aberto, influencia o ambiente e é influenciado por ele.
Nos termos entendidos pela psicologia do desenvolvimento, a adolescência não é um estado, mas sim, um processo orientado para a maturidade. Como aponta Oliveira (2003), diversos teóricos elaboraram diferentes pontos de vista para delimitar essa etapa, em que há uma pluralidade de fatores envolvidos, tais como alterações biológicas, fisiológicas, psíquicas e sociais que dificultam sua caracterização.
Para um melhor entendimento dos aspectos que marcam esta fase, Moragas (1970) e Griffa e Moreno (2008), dividiram a adolescência em três etapas. São elas:
- Adolescência inicial: também chamada de ‘baixa adolescência’, compreende as idades entre os 11 e 12 anos nas meninas e 12 e 13 anos nos meninos. Neste momento, o desenvolvimento corporal é alterado pela transformação brusca do organismo infantil. A diferenciação física entre os sexos, com o aparecimento dos caracteres sexuais primários e secundários fica clara. A mudança do tamanho e da forma do corpo faz aumentar a necessidade de se transformar em adulto e as cobranças a fazê-lo.
- Adolescência média: Entre os 12 -13 aos 16 anos. É o estágio onde ocorre a diferenciação e maturação sexual definitiva, marcado pela construção da identidade sexual. O desenvolvimento corporal reduz e adquire proporções adultas. Os indivíduos voltam seu interesse ao sexo oposto, com um gradual distanciamento afetivo da família, que tornam freqüentes os atos de rebeldia.
- Alta adolescência: Marca o final do período adolescente que é difícil de ser situado no tempo. É a fase de consolidação e ensaios de modos de vida adulta e de relacionamentos. Esse período é marcado pela escolha e decisão vocacional, que em geral, é uma forma de individualização do indivíduo perante a família e a sociedade.
Por meio das etapas apresentadas, mostra-se que a adolescência é permeada por transformações tanto de ordem social, como de ordem biológica. Estas ultimas, são definidas pelo termo ‘Puberdade’, derivado do latim pubertate, que significa ‘cobrir-se de pêlos na região púbica, referindo-se especificamente às mudanças bioquímicas e morfológicas do soma.
Essas mudanças, controladas pelas glândulas endócrinas pouco dependem de fatores ambientais. Com base na teoria apresentada Pereira (2005), pode-se dividir esse desenvolvimento em três níveis:
- Nível 1: Ativação dos hormônios gonadotróficos da hipófise anterior. Esses hormônios-estímulos é que provocam as mudanças corporais e sexuais desse período.
- Nível 2: Secreção do hormônio do crescimento; produção de óvulos ou de espermatozóides nas glândulas de reprodução e o aumento dos hormônios da suprarrenal.
- Nível 3: Desenvolvimento dos caracteres sexuais primários (aumento do pênis e dos testículos no rapaz e aumento do útero e da vagina na mulher); desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários (aumento das mamas, mudança da voz, distribuição de gorduras, modificação da cintura e da pelve, aparecimento de pelos no púbis e nas axilas, aparecimento de barba).
Moragas (1970), Winnicott (1993) e Griffa e Moreno (2008) explicam que embora altamente entrelaçadas, a puberdade e a adolescência não se sobrepõem, pois não são exatamente simultâneas e em alguns aspectos são independentes por completo.
Se devidos a transtornos somáticos, a puberdade não ocorrer, ou ocorrer de forma muita atenuada, nem por isso a adolescência deixará de se manifestar. Embora faltasse a ele a estimulação necessária para provocar as modificações corporais e a irrupção da genitalidade, paradoxalmente enfrentaria a problemática adolescente não no que se refere ao corpo, mas a outros aspectos próprios desse período. (Griffa & Moreno, 2008. p. 11)
Winnicott (1982) explica que na puberdade, o indivíduo é um agente passivo do processo de crescimento. Nesse momento, “tremendas forças estão atuando e, para este problema, não existe nenhuma solução, a não ser contar com a passagem do tempo.” (Winnicott, 1982, p. 115). Para o autor, a puberdade pode ser compreendida como uma situação desalojadora, já que introduz o novo, aquilo que rompe com o que está estabelecido, inclusive com um si – mesmo infantil.
De cultura para cultura, as transformações físicas da puberdade estão associadas a expectativas muito diferentes. Estas expectativas, influenciam o modo como os indivíduos encaram e interpretam a adolescência. Nas culturas em que é atribuído um grande significado e, por isso, uma forte carga de ansiedade, os adolescentes, provavelmente, sentirão maior tensão e algum conflito perante suas próprias modificações pubertárias (Mead,1961).
Pelo que foi exposto até aqui, pode-se concluir que a adolescência não pode ser descrita como uma simples adaptação à transformações corporais, mas sim, como um período decisivo do ciclo vital, onde a pessoa atinge uma autonomia e maturidade psicológica necessária para inserir-se no mundo social.
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Fonte:
Este texto é um trecho do artigo:
O AMOR E OS RELACIONAMENTOS NA ADOLESCÊNCIA: CONSIDERAÇÕES PSICANALÍTICAS
Autores:
Renato Caio Silva Santos
Professor de Psicologia – Universidade Metodista de São Paulo, Brasil
Mestre em Ciências e Saúde Pública – FSP USP, Brasil
Especialista em Neuropsicologia – Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, Brasil
Especialista em Sexualidade Humana – Faculdade de Medicina da USP, Brasil
Aprimoramento em Psicologia Hospitalar – Instituto de Infectologia Emílio Ribas, Brasil
Lucas Matheus Grizotto Custódio
Psicólogo – FMU-SP, Brasil
Murilo Barberini Dias
Graduando em Psicologia – Universidade Metodista de São Paulo, Brasil